Quando eu era pequeno, lembro-me de uma presença firme e forte
conduzindo meu tempo ao salutar hábito da leitura. Meu avô , desde cedo,
almejava construir uma fortaleza cultural no imaginário de cada um de seus
netos. Uma que durasse para sempre. As fundações de minha criação poderiam ter
sido forjadas sob perspectivas voláteis, como a busca incessante de bens e
riqueza. Felizmente, devotei-me a outro tipo de enriquecimento. A magia das
palavras.
Meu avô sempre fez questão de comprar novos livros para mim. Não
recordo de receber dele, por exemplo, artigos de vestuário. Cresci lendo, lendo
muito. E me orgulho disso. As páginas de um livro são um campo interdimensional
onde converge passado, presente e futuro. Já conversei muito com autores
falecidos. Converso constantemente com os que ainda me dão o prazer de sua
presença nesse mundo. Imagino como a palavra literária se propagará no amanhã
digital.
E é exatamente sobre imaginação que almejo falar. Embora eu
nunca tenha visitado a Feira do Livro de Porto Alegre, minha cidade,
acompanhado de meu avô, o evento me traz recordações dele. Mas não apenas dele.
Recentemente, percebi um velho livro em minha estante. As páginas do volume
sofrem com a ação do tempo. Ainda assim, o conhecimento ali impresso é passível
de leitura. O título apresenta diversas marcações de frases e passagens
interessantes. Sempre indaguei a respeito do antigo dono. Até descobrir sua
identidade.
Há alguns anos, resolvi desvendar aonde aquele diálogo de grifos
levaria. A cada página marcada, eu buscava compreender mais sobre o meu
antecessor. Tratava-se de uma pessoa culta, isso se notava de longe. Tinha
prazer em destacar parágrafos edificantes, poéticos. Foi quando minha mãe
revelou que o livro havia pertencido ao meu bisavô, que nem conheci. Ele
faleceu no mundo real, mas, no mundo da imaginação, nós dois viramos melhores
amigos.
Acredito piamente que o castelo de um homem é construído por
intermédio dos tijolos do conhecimento. Após tanto me contagiar com os escritos
dos outros, vou honrar a alma de meus ascendentes. A influência deles, direta
ou indireta, surtiu efeito para que meu gosto ganhasse contornos de um livro de
minha autoria a ser lançado em breve.
A partir de agora, da mesma forma como
apresentaram a literatura a mim, o meu próprio elo com os leitores está
construído. Que seja perene.
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