“Nada mais hipócrita que a eliminação da
hipocrisia.”
(F. Nietzsche)
Dos acontecimentos midiáticos anunciados no
Brasil – e pelo resto do mundo -, nos últimos setenta dias, talvez o melhor foi
dos 70 anos de Raul, que além de maluco, viveu a vida dissipando a loucura, a
música e muita beleza.
Na Vila
de Pedro, denúncias no parlatório dão conta de raposas rasas que estão roubando
o boi – e também o frango – da merenda escolar das crianças que frequentam a
precária e ultrapassada rede municipal de educação. Enquanto vereadores caçam o
bando, nas ruas e lotes baldios – especulados pelas imobiliárias que não
recolhem, em sua grande maioria, o Imposto Territorial Urbano (ITU) – a
prefeitura intenta recolher a sujeira descartada pela população inconsequente.
Deseducada a comunidade atira badulaques de toda espécie, às portas do vizinhos,
alimentando o parasita da dengue que assiste e insiste desfrutando o sofá
rasgado, matando de febre e por raiva a população.
Televisivos,
icônicos, arrogantes e processados os senhores da fé seguem na secular jornada
capitalista tocada a cajado de ouro. Fomentam as romarias de época, reproduzem
o capital do credo pelo poder do centavo no dízimo e, a conta-gotas, perpetuam
a fé inabalável da população leiga, em cerca de 52% analfabeta funcional,
naqueles que promovem semanas da cidadania ou a passagem milagrosa pelo arco da
fé. Assim como a salvação da alma, a dignidade cidadã se encontra, hoje,
distante e inalcançável. Além de direitos, a política pública – financiada pelo
Estado, com dinheiro do contribuinte – não delega aos usuários administradores de
plantão compromissados com organogramas de gestão, culpa talvez dos parcos
salários.
A
serviço dos milagres e instituições que estão onguizando direitos
constitucionais, o alforge da fé induz a população – leiga e faminta por pão e
crença – a acreditar em outra vida na qual não haverá, com certeza, este
trânsito e violência, as desigualdades sociais inaceitáveis além da falta que
fazem os dentes na boca banguela e mal-assalariada. Segundo Johnny Cash: “Sob
as manchas do tempo, os sentimentos desaparecem.”
Eventos emancipatórios metamorfoseados na
conjunção milionária instituições x Estado – tocados a voluntarismo e boa fé de
quem ‘administra a questão social’ – escondem a ponta do rabo do cachorro louco
capitalista em suas mais variadas expressões socioeconômicas e de consequência
política, as quais moldam as necessidades prementes de quem paga impostos e
recebe bênçãos.
Se o
Diabo está no detalhe – como prega o ditado – são claras as denúncias por parte
de fieis que já tem igreja cobrando couvert artístico. Engendrado pela
conjuntura da fogueira social, em plena Festa Junina, na tela digitalizada a
rede social Facebook vai batendo o padre escondido no confessionário e o pastor
adorando seu templo – quando milhões, no bate-papo, discutem se o boneco da Globo
se chama Zeca Camargo ou Tá e anda Amargo. Enquanto milhões reclamam da
seleção, espalhados pelo País, promotores da jogatina e corrupção alardeam –
enquanto trabalham – que ninguém ganha do Brasil no jogo da corrupção.
Hoje,
parceiro de Lobão na militância da ‘nova direita brasileira’, Roger e sua banda
Ultraje a Rigor – ainda nos anos 80 – expunham na janela a questão cultural no
País: “A gente faz música e não consegue gravar, a gente escreve livro e não
consegue publicar. A gente escreve peça e não consegue encenar, a gente joga
bola e não consegue ganhar. A gente somos inútil.” Em final de semestre afetado
pela conjuntura e após a leitura de insubstituíveis militantes sagrados da
labuta social, entre tantas dúvidas, fico com a certeza e sabedoria de Rubem
Alves: “O que me assusta na academia é o lado de dentro dos seus próprios
muros.”
E por
falar em direita, na Câmara, deputados das bancadas da bala, boi e bíblia (BBB)
fetejam a fogos e vingança a insalubre, lamentável e vitoriosa redução da
maioridade penal. Lembrando que a respeito da reclusão social, Foucault
profetiza: “O isolamento ainda é uma forma de acuar e agir sobre o moral dos
seres. E toda instituição parapenal, feita para não ser prisão, culmina na cela
em cujos muros está escrito em letras negras: Deus o vê.” (Vigiar e Punir,
1987, p. 217-258)
Resta-nos
descobrir se os trancamos do lado de dentro, ou pelo lado de fora do Senado,
templos, latifúndios e até mesmo escolas.
E o pulso… ainda pulsa!
Comente este artigo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário